A tarefa dos médiuns receitistas
e os equívocos das consultas
PERGUNTA: - Que dizeis dos médiuns que se fatigam até altas horas da noite nos centros espíritas, extraindo centenas de receitas para os freqüentadores habituais, tarefa exaustiva que cresce de mês para mês? Isso é realmente de efeito proveitoso para a divulgação do Espiritismo, ou trata-se de alguma prova cármica ou serviço espontâneo do próprio médium aceito antes de se encarnar?
RAMATÍS: - A tarefa dos médiuns receitistas e curadores avoluma-se, dia a dia, porque os adeptos espíritas, em sua maioria, ainda confundem o objetivo doutrinário do Espiritismo com a função de um "armazém" fornecedor de passes, receitas, água fluidificada ou recurso fácil para solucionar questiúnculas domésticas. Deste modo e na condição passiva de pedintes insatisfeitos, eles desperdiçam o tempo precioso dos guias solícitos, mas nada fazem pela sua própria reforma interior. Exploram as entidades magnânimas com as solicitações mais esdrúxulas e descabidas, enquanto desfiam o rosário das queixas mais infantis, convictos de que os médiuns não passam de funcionários do "plantão espírita" obrigatório nos centros.
Então, os consulentes mais desavisados e aflitos consomem-lhes até os últimos minutos do descanso justo ou do alimento imprescindível, obrigando-os a ouvir longas histórias de questiúnculas ou de ingratidões do próximo, em que mal disfarçam o amor-próprio ferido, o ciúme dramático ou o orgulho indomável. A "fila" dos pedintes cresce diariamente junto ao médium que logra algum sucesso no desempenho de sua faculdade; e infeliz dele se negar a mínima atenção aos consulentes que já lhe usufruem familiarmente da mediunidade para solver todos os problemas de sua vida particular. Há consulentes que esquecem as diversas receitas e os múltiplos favores que lhes são prestados pelos médiuns de boa-vontade, e passam a condená-la quando ele deixa de os satisfazer uma só vez.
O médium, no conceito comum de muitos adeptos espíritas e simpatizantes de última hora, não tem o direito de negar-se a "fazer a caridade", pois entendem que a sua existência não lhe pertence e o consideram criatura obrigada a sacrificar-se exclusivamente para o bem dos seus consulentes. Raros espíritas reconhecem-lhe a responsabilidade junto à família, a necessidade de buscar o sustento no mundo profano e enfrentar também as doenças e vicissitudes do lar terreno. Ou ele é fonte de benefícios ao próximo, uma criatura invulgar, poderosa e estóica ou, então, quando adoece ou se exaure até ao fracasso é porque se desviou da sua "missão".
PERGUNTA: - Poderíeis dar-nos alguns exemplos desses exageros mais comuns no tocante à solicitação indiscriminada de receitas espíritas?
RAMATÍS: - Os médiuns, conforme já lembramos, quais funcionários do "armazém espírita", são obrigados a atender a todas as solicitações absurdas; e a sua situação ainda mais se agrava quando eles não são sonâmbulos ou mecânicos, mas somente intuitivos receitistas. Neste caso, então, a sua tarefa é mais difícil porque o sucesso do tratamento depende do seu estado moral, condições psíquicas ou saúde física, pois qualquer anormalidade perispiritual impede-os de captar a intuição exata que os guias lhes transmitem.
Os consultantes entendem que os médiuns devem atendê-las em todas as circunstâncias, sem considerarem horários ou as dificuldades e imprevistos humanos, que atingem a todos.
Para esses simpatizantes o médium e os espíritos têm o dever precípuo de curar os efeitos nocivos que eles sofrem, às vezes, devido aos exageros de alimentação, bebidas alcoólicas, gelados e outros desatinos censuráveis.
Eis por que se tornou comum o hábito indiscriminado de pedir receitas mediúnicas para atender a todos os parentes, amigos e conhecidos.
Alguns adeptos espíritas viciam-se aos passes mediúnicos, assim como os fumantes inveterados escravizam-se ao fumo, ou então como os católicos que se habituam à missa todas as manhãs.
Outros, embora gozem de excelente saúde, entram na "fila" de passes e vampirizam os fluidos terapêuticos que poderiam nutrir a outros mais necessitados e realmente enfermos. Mas essa viciação cômoda é justificada graciosamente com a desculpa de que o passe espírita não é desvantajoso mesmo para os sadios, pois, em qualquer circunstância, sempre "faz bem". O Espiritismo, portanto, para muitos, ainda é considerado a tenda miraculosa ou a fonte prodigiosa de recursos fáceis para atender a todas as necessidades mais comezinhas e às consultas mais prosaicas, funcionando os médiuns à guisa de "caixeiros" com a obrigação de atender a todos, sob pena de serem apontados como descaridosos.
PERGUNTA: - Os espíritos desencarnados não poderiam advertir essas criaturas de que o Espiritismo não é doutrina de exclusivo beneficio material? Tal providência não conduziria os seus simpatizantes a uma compreensão mais certa dos verdadeiros objetivos da modificação de Kardec?
RAMATÍS: - O Espiritismo, como o cristianismo redivivo, é um movimento benfeitor endereçado a todos os homens independentemente de classe, de raça, de cultura, de condições sociais ou situação financeira. E o médium espírita, quando é consciente de suas obrigações no seio da doutrina, é sempre a criatura caritativa e afetiva, desinteressada de quaisquer proventos, dádivas ou compensações materiais, cumprindo dignamente o compromisso que aceitou no Espaço em favor dos encarnados e também para redimir-se dos seus débitos contraídos em vidas pretéritas.
Estas considerações são uma advertência quanto à imprudente interpretação unilateral, que se faz da verdadeira finalidade do Espiritismo, na Terra, pois, independente dos passes e dos demais auxílios mediúnicos que ele presta aos homens, é imprescindível que os seus adeptos ou consultantes se devotem especialmente ao seu aperfeiçoamento espiritual.
É razoável que roguem orientações espirituais aos desencarnados, sirvam-se do receituário mediúnico, dos passes ou da água fluidificada, pois tudo isso é realmente serviço e objetivo amoroso da alçada da doutrina espírita como nova mensagem cristã rediviva. Mas não seja apenas isso o único interesse ou realização dos seus adeptos, que já se julgam bons espíritas só porque usufruem de todos os serviços espiríticos. Que não se confunda a renovação espiritual íntima, com a assistência caritativa dos desencarnados, pois a solução dos interesses da vida terrena não gradua o espírito na sua escala angélica.
Comumente, ainda se comprova essa disposição muito interesseira, e exclusiva dos espíritas, pelas soluções materiais, pois, enquanto as salas das sessões de passes, de receituário mediúnico ou consultas psíquicas abarrotam-se de freqüentadores que exaurem os médiuns para atender-lhes toda sorte de indagações e pedidos pessoais, ficam às moscas os ambientes onde o orador estudioso explica os postulados do Espiritismo ou o doutrinador comenta os valores ocultos do Evangelho do Cristo. À medida que mais se vulgariza o receituário mediúnico e também se amplia o serviço caritativo dos espíritos, parece que os seus adeptos ainda mais atrofiam as suas defesas orgânicas e o discernimento próprio, pois tornam-se incapazes de suportar o mais inofensivo resfriado ou enfrentar diminuta contrariedade moral, sem recorrerem a consultar os espíritos desencarnados.
Enquanto os médiuns abnegados obrigam-se a um trabalho heróico e exaustivo no cumprimento do receituário numeroso, os seus consultantes apenas se preocupam com a sua cura física e comodidade material. Esses adeptos só não consultam os espíritos para lhes extraírem chapas radiográficas, receitarem óculos ou arrancarem-lhes os dentes, porque isso ainda não é modalidade explorada pelo Espiritismo, pois faltam médiuns adequados ou então espíritos dispostos a atender a tais pedidos.
Não há dúvida de que o fenômeno mediúnico ou a cura excepcional pode convencer o homem quanto à sua imortalidade, mas isso não comprova que ele se tenha convertido aos postulados superiores do Evangelho do Cristo. Quem se cura definitivamente pelos recursos mediúnicos do Espiritismo fita obrigado a respeitar e conhecer os seus princípios doutrinários, que lhe prestam benefícios maiores sem quaisquer interesses
PERGUNTA: - Desde que o Espiritismo significa a última esperança de cura para os enfermos já desiludidos com a medicina oficial, cremos que não há motivo de censuras aos seus adeptos por buscarem os serviços dos médiuns receitistas, pois é razoável que os neófitos ainda não possam alcançar o verdadeiro objetivo da doutrina, quanto a renovar o espírito para, depois, curar as doenças do corpo. Que dizeis?
RAMATÍS: - Considerando-se que os terrícolas ainda são criaturas viciadas no fumo, nos tóxicos alcoólicos, na glutoneria das mesas e na ingestão das vísceras dos irmãos inferiores, não há dúvida de que os médiuns receitistas e passistas, em breve, sentir-se-ão impotentes para atender à sua clientela cada vez mais numerosa e interessada em resolver todos os seus problemas da vida material. Geralmente, os consultantes espíritas, em boa maioria, tentam obter à noite, no centro espírita, a saúde física e a recuperação psíquica que eles mesmos arruínam, sem precaução, durante o dia.
Confiantes na afabilidade e tolerância dos guias espirituais, eles os sobrecarregam de rogativas e convocam os médiuns para solverem os seus problemas mais comuns. Não desejamos censurar essa atitude infantil ou inconsciente dessas criaturas que fazem da seara espírita kardecista ou dos terreiros de Umbanda a sua "agência particular" de informações. Mas o fato é que a crença espírita não deve ser condicionada ao maior ou menor êxito dos médiuns, pois eles também são homens e, dia mais ou dia menos, terminarão decepcionando os seus clientes comodistas. Os médiuns não são oráculos modernos nem pitonisas, à semelhança do que acontecia nos tempos do paganismo. E a cura física pelo Espiritismo não é prova suficiente para o seu beneficiado julgar-se um adepto credenciado pela doutrina.
PERGUNTA: - Realmente, alguns irmãos explicam-nos que perderam a fé no Espiritismo, porque foram vítimas de mistificações ou fracassos dos médiuns em que eles tanto confiavam e dos quais se socorriam comumente.
RAMATÍS: - Sem dúvida, esses são "ex-espíritas" completamente desiludidos da doutrina porque, imprudentemente, haviam alicerçado sua crença sob a garantia do êxito dos fenômenos mediúnicos. É óbvio que essa fé também deveria aumentar ou diminuir de acordo com o maior ou menor sucesso dos médiuns no seu intercâmbio com o Além-túmulo. Em conseqüência quando ocorreu o fracasso ou a mistificação, eles também regressaram aos velhos caminhos da dúvida e da descrença, repudiando os postulados da doutrina e olvidando também os benefícios e o conforto espiritual que receberam dela nos seus momentos de angústia e sofrimento.
Em verdade, tais "adeptos" não passam de simples curiosos mal-agradecidos que, tendo provado um vinho azedo, passam a negar a existência do vinho bom. O primeiro insucesso ou equívoco mediúnico serve-lhes, então, de motivo para execrarem todas as demais virtudes da doutrina espírita e o serviço amoroso dos espíritos desencarnados. Em seguida, lamentam a sua ingênua peregrinação através dos centros espíritas, quando buscavam a solução definitiva para os seus males e só recebiam contemporizações dos médiuns e espíritos.
Infelizmente, trata-se de criaturas que ignoram o processo justo e redentor do Carma, que premia a "cada um conforme suas obras". Evidentemente, em suas existências anteriores, elas abusaram da inteligência e da astúcia na prática do mistifório e da burla, e por esse motivo se candidataram também às mesmas incertezas e decepções atuais. Malgrado não conheçam a engrenagem retificadora da Lei de Causa e Efeito, nem por isso estão isentas de sofrer o reajuste espiritual para encerramento de sua conta devedora na contabilidade divina.
Os médiuns não são responsáveis pelas contingências imperativas da Lei Cármica, que age para o devido reajuste espiritual das mesmas.
O Alto não toma medidas reprováveis, de teor vingativo, como veículo de resgate de dívidas cármicas dos espíritos devedores. Nenhum médium é obrigado ou induzido, pelos mentores siderais, a praticar deslizes ou criar acontecimentos punitivos a fim de que os infratores da Lei divina sejam corrigidos.
PERGUNTA: - Poderíeis esclarecer-nos como e quando coincide o fracasso ou a mistificação ante aqueles que, devido à Lei Cármica, ainda não merecem receber provas das realidades de Além-túmulo?
RAMATÍS: - Quantas vezes os trabalhos de fenômenos físicos, que se processam com seguro êxito ante os que têm certeza absoluta da existência e imortalidade da alma, fracassam por completo quando comparecem a esses atos o ateu, o curioso ou os zombeteiros, os quais, no entanto, talvez se convertessem diante das provas irrefutáveis? Outras vezes, os dirigentes dos trabalhos fenomênicos mediúnicos esforçam-se para oferecer a certas criaturas algumas provas da interferência dos espíritos desencarnados e, contudo, também falham os melhores prognósticos, deixando até maior dúvida nos assistentes?..
Malgrado se queira fazer crer que os espíritos costumam intervir promovendo deliberadamente tais fracassos, estes resultam da própria Lei Cármica de retificação espiritual, que associa as coincidências, afastando os candidatos "indesejáveis" nos dias em que os trabalhos terão sucesso positivo. No entanto, essas criaturas não estão sendo vítimas de uma punição propositada, mas o seu passado ateísta e leviano é que só lhes permitirá encontrarem as verdades que subestimaram e ridicularizaram, empenhando-se agora num esforço do seu próprio raciocínio e mediante a dor purificadora que ajusta o caráter à melhor compreensão das verdades espirituais.
Se assim não fora, que importância teriam os postulados superiores do espírito ou a própria advertência de Jesus, quando aludiu a que a "semeadura é livre, mas a colheita é obrigatória"? Ademais, seria uma concessão privilegiada e imerecida do Alto, o facultar comodamente as provas da sobrevivência àqueles que, no seu passado, combateram a esperança da imortalidade, apagando-a da mente das criaturas simples que surgiram no seu caminho.
Embora a criatura ignore transitoriamente as causas pretéritas que a submetem a certas provas, ela não poderá livrar-se das contingências "fatais" que lhe impõem reparar "até ao último ceitil", todos os erros que haja praticado, pois a "contabilidade divina" não faz estornos. Mesmo porque se trata da própria redenção espiritual do devedor. Aqueles que, em vidas anteriores, usaram de sua inteligência, cultura e privilégios, semeando a descrença e o ateísmo nas mentes menos esclarecidas, a Lei, depois, obriga-os a provas cármicas de teor equivalente.
É o que acontece também aos que, tendo abusado da sua arte ou do seu talento, depois, quando voltam à Terra, noutra encarnação, por mais que se esforcem e lutem para vencer, a dita Lei do Carma priva-os de obterem o êxito desejado. É o caso de inúmeros jovens que tentam estudar Medicina, Engenharia, Pintura, Música ou qualquer outra matéria, mas a Lei Cármica interfere opondo-lhes obstáculos de toda ordem e até deficiências intelectuais e físicas, que os impedem de conseguir realizar o objetivo sonhado.
Sim: - Quantas vezes, um livro de temas ou concepções licenciosas e deprimentes é qual vírus infeccioso a intoxicar a consciência da coletividade? E outros, que, pelas idéias expostas em suas páginas, instigando movimentos de ódio e vingança de caráter niilista, são uma espécie de rastilho mental incendiário, que resulta em conflitos de sangue e morte, levando a angústia e a desgraça a muitos lares?...
Na época que viveis, o próprio ateísmo que encontrou agasalho na mente de uma parte da vossa elite intelectual tem sua matriz nos livros de alguns pensadores ousados, cuja concepção "positiva" não aceita a existência de Deus porque, segundo alegam, ainda não conseguiram encontrar-se com Ele, face a face!...
Em tais casos, aos espíritos autores de semelhantes livros, ao voltarem à Terra, noutra reencarnação, ser-lhes-á subtraída a capacidade mental de tornarem a ser escritores ou, se o forem, terão de escrever obras cujas idéias e teorias, em sua substância, combatam o ateísmo que propagaram antes e contribuam, de forma positiva, para edificar os postulados da fraternidade, amor e tolerância na consciência da Humanidade.
É, enfim, a Lei Cármica compelindo o devedor a resgatar o seu débito contraído na sua existência anterior. E, ao mesmo tempo, ajustá-lo ao equilíbrio moral indispensável à sua própria evolução espiritual.
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