ENIGMAS DA PSICOMETRIA
ERNESTO BOZZANO
HISTERIA DA AMOSTRA N° 5
Colocando a mão sobre a amostra embrulhada em papel grosso e constituída de uma substancia dura e resistente, percebo imediatamente dois ou trás homens a examinarem uma parede negra.
Um desses homens tem à mão uma lanterna; outra pesquisa, insistente, aqui e ali, mostrando-se muito prudente antes de dar a sua opinião.
(Eis uma descrição fiel dos inspetores de minas, que descem pela manhã aos poços, munidos da lâmpada de segurança, a fim de verificarem se tudo está em ordem, antes da chegada dos trabalhadores. - S. Jones.)
Pressinto que neste embrulho está um pedaço de carvão, nada xistoso. É uma bela qualidade de hulha. (Perfeitamente: hulha Heathen. - S. Jones.)
Foi arrancado de grande profundidade.
(Efetivamente: da camada mais profunda da mina. - S. Jones.)
Os homens que trabalharam nessa espécie de túnel estão muito abaixo de um ponto de onde me chegam ruídos de rodas e vagões em movimento.
(A superfície do solo, uma via férrea de bitola estreita passa muito perto do local em que foi extraída essa pedra. O túnel escuro é um dos ramais da mina. - S. Jones)
Vejo grupos de homens em atividade para abrir passagem através de um negro paredão. Uns de pé, outros agachados; todos, porém, em posições forçadas e contrafeitas.
(Os mineiros trabalham realmente em grupos isolados. Quanto ao mais, é observação exata do penoso trabalho de mineração.)
Agora, meu olhar se fixa num homem que trabalha sozinho, em uma galeria tão baixa e tão estreita que a força a deitar-se. Ao contemplá-lo, assalta-me um como sentimento de tristeza e ansiedade; sou levada a orar e a desejar que se não verifique um desmoronamento capaz de o esmagar...
(Não. Há muito tempo que nesse ponto não ocorrem desastres. - S. Jones)
Coisa singular! Os pensamentos desse homem não se prendem à sua tarefa. Ele está pensando na esposa e no filho de tenra idade. Percebo, agora, um cemitério de aldeia, no qual repousam criaturas de condição humilde, em grande escala, e leio as inscrições ingênuas apostas em suas respectivas campas.
(Não há cemitério nem igreja nos arredores. O cemitério mais próximo está a distancia de uma milha. - S. Jones.)
Tenho diante de mim uma parede negra, impenetrável e inexplorada; percebo água a pequena distancia... Experimento vibrações tão fortes, tão vivas, que sou forçada a passar adiante. Agora, é como se o caminho se abrisse à minha frente, a levar-me para a direita. Estou perturbada: é preciso vedar ou desviar esta fonte, sob pena de ver os operários afogados quais ratos em suas luras.
(Exatíssimo! Pura verdade! Há grande quantidade de água nas minas, precisamente na direção apontada. Essa água é tanta que, numa galeria perfurada, à direita, houve de abandonar-se o trabalho antes de atingir o filão carbonífero, porque a pressão da água impossibilitava os trabalhos de aproximação. Presentemente o perigo está quase conjurado e os operários presumem que a fonte estaria seca, se não houvesse sempre água no subsolo. - S. Jones)
Impossível se me torna, agora, traduzir nitidamente as impressões que experimento, triste e contraditório! Sinto-me ansiosa e preocupada com uma região inexplorada destes antros escuros e cavernosos. Estou como que empolgada pela idéia de um perigo iminente e indefinível, dói-me a cabeça, sufoco, tenho sensações vertiginosas. É como se houvesse um perigo a temer nos veios dágua. A dispnéia aumenta, os pulmões como que se colam às costas; nariz, olhos, ouvidos, boca, saturam-se de uma espécie de gás pesado e impuro. Estala-me o crânio...
(Excelente descrição dos efeitos da saturação úmida, de começo muito acentuada nesta mina. - S. Jones)
Oh! que visão horrível! Vejo o homem, há pouco descrito, estertorante no chão, lívido, a sangrar pela boca, pelo nariz, pelos ouvidos!
(Eureca! Estupenda revelação! Agora me lembro de que há vinte anos um operário ficou mortalmente ferido nessa galeria, quando tentava atingir o filão carbonífero, e isso justamente por efeito de uma inesperada inundação. Esse homem faleceu quatro semanas após o acidente e sua mulher deu-lhe um filho horas antes de ele morrer. Ora, essa criança, hoje rapaz de vinte anos, é o próprio que nos entregou a amostra psicometrada. Será daí que lhe tenha provindo essa impressão de tristeza? - S. Jones.)
Neste momento desço abaixo desta camada de hulha. Meu pensamento se prende a centenas de séculos anteriores ao Cristo! Estou a ver uma floresta cujas árvores têm uma folhagem tão espessa que me impedem de ver o céu. Diviso urso de um pardo-escuro, quase negros, procurando as suas cavernas. Um animal monstro, de pé, sobre uma rocha da qual jorra uma coluna dágua, semelhando um lençol. De modo vago, ligo esta fonte à que existe atualmente na mina e de que me proveio tão grande angústia.
(Veríssimo! Informaram-me que a água que inundava a nossa mina jorrava de baixo para cima! Que belas observações verídicas neste vosso ensaio psicométrico! - S. Jones.)
O Sr. Jones acrescenta a seguinte nota relativa ao fragmento de carvão psicometrado:
(Trata-se de hulha tecnicamente denominada Heathen devido à camada especial de carvão, de que foi extraída. Há na mina diversas camadas ou filões dessa natureza, separados por sedimentos de outra espécie. O carvão dito Heathen é o proveniente da camada mais profunda. Essa amostra foi-me trazida por um mineiro que a teria conduzido na mão ou no bolso, o que aliás não posso afirmar, porque já me não recordo. - S. Jones)
Neste primeiro caso os enigmas a resolver se enredam de modo inextricável. Preferível, pois, prosseguir na exposição dos fatos mais simples, a fim de deslindar a meada.
E até que o possamos fazer, notemos este fato : de todas as hipóteses que nos ocupam, nenhuma se nos afigura menos indicada para explicar os fatos, do que essa mediante a qual um objeto viesse revelar a sua própria história.
Teoricamente, não se pode admitir que um pedaço dz carvão mergulhado nas profundezas da mina, a centenas de metros do local em que se ferira um operário vinte anos antes, tenha podido receber as vibrações mentais desse operário, de modo a revelar o seu drama à clarividente. A vista de tal incidente, a solução mais verossímil seria supor que a amostra recolhida, e conduzida pelo filho da vítima, se impregnasse da influência vital do rapaz.
Então, a sensitiva, ao desvendar a relação existente entre a amostra e seu portador, teria haurido na subconsciência deste o conhecimento do acidente.
Reconheço, todavia, que esta última suposição é uma tanto audaciosa, e como o filho se intromete, indubitavelmente, de qualquer modo, na revelação psicométrica, fácil se tornaria eliminá-la, supondo que por intermédio dele uma relação telepática se estabelecesse entre a sensitiva e o pai falecido.
E uma hipótese esta que articulo, porque, no relatório, se verifica um incidente impossível de figurar na subconsciência do rapaz, a saber: - a declaração da sensitiva, de que os pensamentos daquele homem não se prendiam à sua tarefa, mas dirigiam-se à mulher e ao filhinho -, observação esta que poderia muito irem se referir a qualquer traço característico do morto e constituir uma de suas reminiscências, mas que o filho não estava, então, em condições de conhecer.
Pode acrescentar-se que a sensitiva denunciou uma fonte de água ameaçadora, que demandava imediata oclusão ou desvio, operação esta que já se executara, porém, posteriormente ao tempo em que o morto aí trabalhava.
Aliás, daquela mesma circunstância foi que derivou o acidente de que foi ele a vítima, fato este cujo advento leva, por isso mesmo, a crer que se trata de uma reminiscência póstuma, telepaticamente transmitida à sensitiva.
Pelo que diz respeito à exata descrição da mina, a hipótese menos ampla constituiria no supor que uma relação telepática se estabeleceu entre a sensitiva e a subconsciência do remetente Sr. Jones, funcionário da dita mina.
Ficaria para resolver o problema que se apresentou à sensitiva, da visão pré-histórica de uma floresta paleológica, povoada de ursos e ligada ao passado da mina.
Para este caso especial, ainda se poderia supor que a sensitiva haurisse uma imagem pictográfica nas reminiscências subconscientes de leituras feitas pelo Sr. Jones.
Hipótese ousada, também, mas que acolhemos no momento e na expectativa de considerar episódios outros do mesmo gênero, teoricamente mais nítidos e de molde a excluir a hipótese arbitrária de uma subconsciência de latitudes infinitas, que é também o ultimo refúgio do misoneísmo científico.
II Caso - Encontra-se também em Light (1903, pág. 273 ) , uma série de experiência feitas com amostras enviadas pelo Sr. Samuel Jones a Srta. Edith Hawthorne.
Aqui, a exposição é precedida da seguinte advertência
Diversos pesquisadores manifestaram desejo de conhecer a distAncia que separa a destinatária do remetente, o que me leva a declarar que o Sr. Jones reside em Dudley, Worcestershire; 6, Askew Bridge, Gornal Wood e a Srta. Edith em Londres, 3, Upperstreet Islington. Aqui, como no primeiro relato, as anotações do Sr. Jones vão entre parênteses.
AMOSTRA N° 11
Coisa singular! Com este espécime, sinto-me invadida por uma forte impressão de remota antiguidade! Não obstante, percebo tratar-se de terra apanhada à superfície do solo, muito perto de um grande muro de pedra.
(Exatíssimo! Terra colhida na base de um grande muro divisório de antiqüíssimo pátio.)
Subo penosamente uma colina escarpada, dirijo-me às ruínas de velho castelo. Do alto de uma torre, ou dentada muralha, contemplo a cidade. Entre os escombros do castelo avisto arqueólogos, que palpam sisudamente as paredes decrépitas. Ouço-lhes palavras e risadas, e também o casquinar de petizes que jogam o críquete. Agora, os soldados de Cromwell, que se atropelam e precipitam para galgar as alturas... E, agora, o nome deste lugar: - Castelo de Dudley.
(Exato. Cromwell com os seus soldados tomou parte na destruição deste Castelo, cujas ruínas se ostentam no topo de uma colina. Esse local é muito visitado por excursionistas e, graças a uma especial concessão do conde Dudley, todos os anos se faz, em dia determinado, uma festa recreativa, dedicada às crianças dos arredores. - S. Jones)
Neste instante deixo as cercanias do Castelo e atravesso uma cidadezinha. Observo as lojas, sinto um cheiro agradável de pão fresco, ainda quente, que me abre o apetite; contemplo bolos e tortas na montra de uma confeitaria.
(A pessoa que me trouxe esta amostra, passou junto de uma carrocinha carregada de pão fresco, ainda quente, precisamente defronte de uma confeitaria. - S. Jones.)
(O portador em questão também passou por uma agencia postal. Esta amostra foi apanhada com uma colher e diretamente colocada na caixa. Não sofreu, portanto, qualquer outro contacto. Assim, não posso compreender como pode ser influenciada por. observações do seu portador. - S. Jones)
Tem razão o Sr. Jones para se admirar deste último detalhe, tão curioso quão misterioso, ainda que a explicação que lhe atribui não seja a mais convinhável.
De fato, é muito possível que o objeto não tenha sido influenciado pela visualidade do seu portador e sim saturado do seu fluido vital, condição que permitiu à sensitiva entrar em relação telepática com a subconsciência do portador e conhecer das suas sensações, à vista do pão fresco e do seu cheiro aperitivo.
Por outro lado, as diferentes visões que se apresentam à sensitiva, em meio às ruínas do Castelo de Dudley, não são, provavelmente, outra coisa que uma sucessão de imagens pictográficas, hauridas telepaticamente na subconsciência do Senhor Jones.
Na análise da amostra n° 10, a que deixo de me reportar para não alongar muito esta exposição, trata-sé de um punhado de terra do jardim do Senhor Jones.
A sensitiva observa imediatamente que se trata de terra colhida à superfície do solo, revela a existência, no subsolo, de uma mina de hulha e acrescenta:
A distancia de duzentos ou trezentos metros do local em que foi recolhida esta terra, há casas ameaçadas de desmoronamento, devido aos trabalhos subterrâneos de mineração.
Esse desmoronamento verificou-se alguns dias depois claro que a sensitiva não podia extrair esta informação da amostra de terra que ela apertava nas mãos, ao passo que podia extraí-la, de qualquer modo, da subconsciência do Sr, Jones, que não ignorava a situação periclitante daquele grupo de casas.
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