ERNESTO BOZZANO
XIV Caso - Eis aqui outro exemplo duplo da psicometria de ambiente.
Difere do precedente pela circunstância de as percepções não advirem de um ambiente fechado, qual uma alcova, mas aberto, qual um campo, e, de resto, concernentes a acontecimentos velhos, de vinte e dois séculos.
A narrativa é extraída de um livro de Viagens na Itália, do escritor inglês George Gissing, intitulado By the Ionian Sea (pág. 83-85).
Quando se verificou o incidente, achava-se o autor enfermo, na cidade de Crotona, onde Pitágoras fundara a sua célebre escola.
Possivelmente, na febre que o assaltava, estaria a causa predisponente à emersão temporária das suas faculdades supranormais.
Eis o que diz Gissing:
Tornei-me momentaneamente vidente e confesso: experimentei uma sensação de bem-estar real, qual antes não conhecera, de perfeita saúde.
Achava-me perfeitamente acordado e calmo, quando tive uma série de visões maravilhosas.
Em primeiro lugar vi um grande vaso ornamentado de esplêndidas figuras; depois, um mármore sepulcral com baixos-relevos de beleza clássica, perfeita.
Sucederam-se, então, outras visões desdobradas e desenvolvidas em dimensão e complexidade; presenciei cenas da existência social dos antepassados, vi ruas cheias de gente, cortejos triunfais, procissões religiosas, salões festivos e campos de batalha.
O que mais me admirava era o colorido maravilhoso dos ambientes. Impossível dar uma idéia do esplendor desbordante das cores, que tonalizavam cada cena!
Como poderia eu descrever com exatidão os detalhes de cada imagem visualizada?
Coisas que não podia conhecer e que a imaginação também pudera jamais criar, apresentaram com absoluta expressão de viva realidade.
Surpreendia-me, muitas vezes, a contemplação de certos costumes pitorescos dos quais eu nada lera, motivos arquitetônicos inteiramente novos para mim, traços característicos diversos e insignificantes dessa tão remota civilização, que eu não pudera ter apreendido nos livros.
Lembro-me de uma sucessão de rostos admiravelmente belos; lembro-me, também, do sentimento de pesar que me assaltava quando alguma daquelas personagens se esvaecia a meus olhos.
Para dar uma idéia das representações complexas que desfilaram a meus olhos, vou descrever uma visão histórica que, mais que todas, se me gravou na mente.
Quando Aníbal, após a segunda guerra púnica, se transportou com seu exército para o Sul da Itália, fez de Crotona seu quartel-general.
E quando, obediente às ordens de Cartago, abandonou a Itália, foi em Crotona que embarcou o seu exército.
Aníbal tinha consigo um contingente de mercenários italianos e, no intuito de os impedir se alistassem nas fileiras inimigas, ordenou-lhes que o acompanhassem à África.
E como eles se recusassem a obedecer-lhe, o general cartaginês os concentrou na praia, onde foram todos massacrados.
Ora, eu vi a costa de Crotona e o promontório com o respectivo templo, não tais como se apresentam na atualidade, mas como deveriam ser há dois mil anos.
O drama daquela carnificina se desenrolou a meus olhos nas suas mínimas particularidades.
E tudo aquilo resplandecia a luz de um Sol maravilhoso, sob a cúpula de um céu transparente e de tal modo fascinante, que, só de os evocar, ainda me sinto deslumbrado de tanta luz e tanta cor.
A alegria extática de semelhantes visões valia bem os dez dias de febre que elas me custaram, e, apesar do intenso desejo de as renovar, nunca mais pude obter algo de semelhante.
O respiradouro pelo qual elas se haviam insinuado ficara fechado para sempre.
Mas, seja como for, eu acreditarei, eu sentirei sempre que, durante uma hora, foi-me possível contemplar aspectos da vida social de tempos remotos, tão de minha predileção.
Se me objetam que essas visões não correspondiam a qualquer coisa de real, eu responderia pedindo me explicassem por qual milagre cheguei a reconstituir, com a mais minuciosa perfeição, um mundo que apenas conhecia pelas suas ruínas atuais.
Como se pode deduzir do seu relato, o autor está intimamente convencido de que as maravilhas visualizadas algo continham de verídico.
A mim me parece que se não pode deixar de dar-lhe razão, considerando o que ele assevera, em relação aos detalhes históricos e motivos arquitetônicos pela primeira vez revelados no curso das suas visões, circunstância dificilmente conciliável com a hipótese alucinatória, máxime, se aproximarmos essas visões de outras análogas, que podiam ser e foram, de fato, verificadas.
Timbrando a hipótese alucinatória, observarei que, se antes das investigações metapsíquicas, fora lícito aplicá-la a todo e qualquer fato inconciliável com a realidade conhecida, hoje isso não se justifica, diante da classificação de tantos fantasmas telepáticos, assombradores, premonitórios, incontestavelmente verídicos, bem como de tantas visões do passado, do presente e do futuro, rigorosamente autenticadas. Assim, pois, não é razoável a recusa absoluta de experiências que, como a precedente, conquanto não possam ser verificadas, contêm elementos que não conseguimos explicar por outras hipóteses.
Em acolhendo a opinião de Gissing admitindo que as suas visões constituem, como tudo parece indicar, uma reprodução autenticamente psicométrica dos acontecimentos a que se reportam, não restaria então, para explicar os fatos, senão recorrer a uma hipótese já precedentemente enunciada, ou seja, aquela pela qual supomos que os sistemas de vibrações correspondentes à atividade dos seres vivos e da matéria inanimada são registradas em um meio etéreo.
No livro da Senhora Elsa Barker, intitulado Letters from a Living Dead Man, a personalidade mediúnica que se comunica assim se exprime a respeito da antiga civilização grega:
O éter que domina esta quase ilha gloriosa tem nele gravados, em séries ininterruptas, os fastos do seu passado: audácias de pensamento e audácias de execução. E os feitos antigos são de tal arte radiantes, que fulguram através da camada de impressões que se lhes sobrepuseram.
Esta afirmativa de origem mediúnica identifica-se com a hipótese por nós proposta, isto é, que o éter espacial é o meio receptor e conservador das vibrações correspondentes à atividade do Universo.
Dada a existência de uma categoria de fenômenos psicométricos com percepções provindas do ambiente, é força reconhecer que nenhuma hipótese se pudera imaginar mais convinhável do que esta, para lhes explicar a origem.
XV Caso - Relatarei agora alguns casos de psicometria premonitória assaz freqüentes nesta ordem de fenômenos, limitando-me, todavia, a citar três exemplos, que não suscitam problemas especiais do ponto de vista psicométrico, mas provocam outros, e formidáveis, no tocante à sua gênese e ao problema filosófico do livre-arbítrio.
Respigo o primeiro exemplo do Boletim da Sociedade de Estudos Psíquicos de Nancy (novembro de 1904), que inseriu o resultado de uma série de experiências feitas com o sensitivo Phaneg, pseudônimo de um escritor francês, autor de conceituada obra sobre Psicometria e um dos principais sensitivos que o Sr. Edmond Duchatel utilizou na sua sindicância.
A Senhora X nos conta o seguinte, de sua experiência pessoal
Entreguei a Phaneg uma jóia que constantemente trazia comigo, de há muitos anos.
Logo que a teve em mãos, começou ele a descrever o castelo da Duquesa de Uzès, em Dampierre. Depois, acrescentou: percebo uma senhora morena, acamada numa alcova amarela.
A seu lado está um médico que parece inquietar-se muito com o estado da enferma...
Esteve a senhora doente, ultimamente?
A minha resposta negativa, Phaneg acabou por dizer: Neste caso, a enfermidade que eu vi deve ainda reaparecer. Ora, quinze dias depois, a predição se realizou! Enfermei gravemente, a ponto de inspirar sérios cuidados ao meu médico assistente.
O redator do Boletim assim comenta o caso:
O Senhor Phaneg viu o clichê da enfermidade sem poder assinalá-lo no passado, quanto no futuro da consciente:'
Também poderíamos acrescentar que ele extraiu a informação no subconsciente da senhora, cujo organismo podia achar-se afetado dos sintomas precursores da moléstia que explodiria quinze dias depois.
XVI Caso - Maior dificuldade de solução é o que nos apresenta o problema de precognição, neste caso respigado da obra do 5r, Edmond Duchatel, intitulada: - A Vida no Tempo e no Espaço (pág. 51).
Aos 31 de julho de 1909 apresentamos à Sra. L. Faignez um objeto que pertencera a outra senhora, cuja presença sabíamos, no momento, em Londres.
Eis um extrato dos dizeres da psicometra:
Esta pessoa está no interior e na região das montanhas. Neste momento prepara-se para sair. Ri (superficialmente), mas no imo do coração não está satisfeita.
Ouço uma dama que lhe quereria dizer Bichette (é assim que a chama sempre) e perguntar-lhe por que suspira de quando em quando.
A senhora que assim fala não é muito alta, nem robusta. Francesa, de boa aparência, uns 40 anos de idade.
Não foi sem desencanto que apontamos estes informes, inexatos no momento da experiência, ou seja, em 31 de julho. Contudo, eles se verificaram nos princípios de setembro, isto é, 35 dias depois.
A minúcia das descrições, inclusive o apelido familiar, permitiu identificar o quadro então descrito como atual, quando concernia ao futuro.
Neste caso, do ponto de vista psicométrico, dever-se-ia dizer que o objeto apresentado à sensitiva serviu para colocá-la em relação com a subconsciência da sua dona, e que, até aí, nada há que aberre dos processos normais da psicometria.
Nada obstante, é dificílimo conceber que a Senhora Bichette pudesse encerrar os detalhes de um episódio insignificante, a realizar-se 35 dias mais tarde.
Procurei responder a esse formidável problema na minha obra Os Fenômenos Premonitórios e como as dificuldades não interessam a psicometria, recomendo essa obra aos que desejam aprofundar o enigma. De preferência me deterei num outro detalhe, relativo a psicometria em suas modalidades de manifestação.
Nos dois casos precedentes, temos podido notar que os sensitivos vêem como presentes os acontecimentos futuros.
Por causa desta particularidade, que é quase de regra nos fenômenos de que nos ocupamos, abriram-se e continuam a sustentarem-se longas discussões filosóficas, para mostrar que esse fato constitui prova favorável do ETERNO PRESENTE.
Ocioso não é, portanto, notar que a confusão de tempo, nos sensitivos, prende-se a uma causa menos transcendental, isto é, que nos fenômenos de clarividência, em geral, é sempre o EU integral subconsciente (ou espiritual) que percebe; e nestas condições, não podendo ele transmitir ao EU consciente (ou encarnado) as suas percepções, porque elas são de natureza espiritual, recorre à forma sensorial das imagens pictográficas, que, por sua mesma natureza, não podem sugerir aos sensitivos qualquer idéia de localização no tempo.
O fato nada tem de comum com a inconcebível hipótese do ETERNO PRESENTE.
Ao demais, importa considerar que às vezes o EU integral, subconsciente, consegue transmitir ao sensitivo uma vaga idéia das localizações no tempo, recorrendo ao sistema de apresentação das imagens pictográficas mais ou menos distantes da visão subjetiva do sensitivo, de modo que, quando as imagens se mostram mais ou menos distantes, significam que o fato deverá realizar-se em data mais ou menos afastada.
Daí ressalta que o EU integral subconsciente possui a noção das localizações no tempo - o que daria um golpe sério na hipótese do PRESENTE ETERNO.
XVII Caso - Este, condiz com um vaticínio de morte, ligado à recente guerra.
É um episódio notável, sobretudo do ponto de vista dos complexos problemas que suscita.
Respiguei-o de uma conferência do Senhor Duchatel, publicada nos Anais de Ciências Psíquicas (1916, pág. 17). Diz o conferencista:
Aos 8 de agosto de 1913, mediante a simples apresentação de uma carta, que ela nem se deu ao trabalho de fitar, a Senhora Feignez, depois de me traçar exatamente à fisionomia moral e física do Sr. Raimundo Raynal, declarou que ele morreria de morte acidental, dentro de dois anos, caso viesse a deixar Paris, e ferido em pleno rosto por um pedaço de ferro, sobre ou perto de um veículo, que não era de estrada de ferro.
Tudo isso é vago, certo, mas também não podemos exigir, da mais autentica psicometria, a precisão que, todavia, ela nos depara, máxime em se tratando dos relatos de um simples guarda-florestal.
A 17 de novembro ela declarou, á vista de uma segunda carta, que já havia predito a morte do rapaz e que ele não escaparia desse perigo, a menos que o impedissem de sair de Paris.
Atribuo ao sujet o aditivo de uma exortação piedosa, quais costumam fazer os psicometra para consolo dos consulentes.
Meu Deus! - disse - ele poderá, talvez, escapar desse perigo... Depois... além do mais, eu não sou infalível.
E ajuntou que a morte sobreviria, de qualquer modo, causada por um pedaço de ferro.
No dia 24 de novembro o Sr. H. L., amigo do falecido, impressionado com o vaticínio, levou 8 vidente uma outra carta de Raynal.
A sensitiva imediatamente reconheceu pelo tato a pessoa de quem se cogitava e de novo lhe esboçou o seu retrato perfeito. Malgrado as negativas tendenciosas do Sr. H. L., para induzi-la em erro, reproduziu-se à visão e a confirmação da morte dentro de um ano, e sempre do mesmo modo.
Ao dizer-lhe o Sr. H. L. que Raynal não poderia afastar-se de Paris, ela lhe declarou que ele a isso seria constrangido por uma força maior e mais: - que a sua ausência seria de um mês, que a sua morte não seria logo conhecida, e sim dentro de um mês e meio, mais ou menos.
Mobilizado em 4 de agosto, o Senhor Raynal foi morto em 5 de setembro.
No dia 19 a Sra. H... levou á Senhora Feignez a última carta de Raynal, a fim de obter detalhes da sua morte e eis o que conseguiu:
A Senhora Feignez declarou que ele não sofrera um instante, sequer, ao tombar fulminado por uma bala, na vista direita; que essa bala só a ele vitimara, não em combate, mas em comissão, quando procurava desempenhar as ordens recebidas, tendo junto de si dois ou três camaradas, apenas.
Finalmente, que, poucos dias antes, havia recebido uma carta postal que lhe eu escrevera.
E acrescentou mais: a senhora há de lhe encontrar o cadáver, a sepultura... Havia que procurá-la não no campo, mas à margem direita de um caminho e a distancia de alguns metros de um molho de palhas.
Ora, o Senhor Raynal, ciclista de ligação entre o General-de-Brigada e o seu Coronel, tinha, conforme as informações posteriormente obtidas, junto de si a bicicleta (veículo que não é caminho de ferro) e assim se verifica, a despeito da nebulosidade de certas instruções, a exatidão dos fatos.
Raynal foi ferido precisamente no momento de reunir-se ao seu Capitão, por uma bala que lhe penetrou o olho direito (eis o pedaço de ferro) e, varando-lhe o cérebro, passou de raspão pela espádua do Capitão.
Ele não sofreu um instante sequer... Assim foi. Morte fulminante. E a Sra. H... acrescenta: tinha recebido uma carta postal entre 4 e 6 de setembro; por conseguinte, alguns dias antes, e eu encontrei o corpo em Barcy, ao norte de Meaux, aonde cheguei depois de ter atravessado água.
O corpo estava envolvido em palha, a sepultura não apresentava qualquer indício aparente, mas, aos primeiros golpes de picareta, quase à flor do solo, surgiu a sua caderneta militar.
Finalmente, o corpo lá estava num campo, junto de um monte de palha.
O Senhor Duchatel nota, a propósito deste caso:
Aí temos um ator tombado no campo da luta!
É uma morte que honra o teatro a que ele pertencia e do qual era uma das melhores esperanças.
Pois bem! Até parece que o seu papel fora de antemão escrito e que ele soube interpretá-lo depois de escrito.
Notareis que, na intercorréncia desses dois anos, algo se passou de mais grave, de muito mais importante, do ponto de vista geral, do que essa morte de Raimundo Raynal... Sobreveio esse evento formidável de que ele foi uma das primeiras vitimas, sem que o respeito uma só palavra se articulasse.
E aquele pedaço de ferro? Deus meu! Pois não é ele anunciado Como, por exemplo, se tratasse de um brinquedo de criança?
A sensitiva diz - é um pedaço de ferro, e, no entanto, ela ignorava a guerra!
E viu, contudo, que, dentro de dois anos, aquela criatura morreria, sem saber que tal sucederia num campo de batalha! Enfim, acabou facilitando o encontro do corpo!
Diante disso, estaremos inibidos de perguntar - tomando por paradigma este exemplo de um ator teatral - se o nosso papel não estará ¡á escrito e para um cenário preparado por alguém que ignoramos, mas cujos vestígios se encontram em alguma parte e são eventualmente perceptíveis por sujets extraordinariamente delicados e sensíveis?
Pergunto-vos, pura e simplesmente, se nós não seremos atores; se, quando julgamos improvisar não fazemos mais que repetir, e ocorre-me o que seria até certo ponto uma solução: isto é, que por mais reduzido que fosse o nosso livre-arbítrio, ele não deixaria de existir, tanto quanto existiu o do ator Raynal.
Entre os atores, há os que interpretam mal o seu papel; há os que representam fielmente; há os que nele empenham todo o seu ardor, sua estrela, seu ideal, fazendo de um papel insignificante uma criação artística inimitável; e há os cabotinos que rebaixam ao nível de rasas mediocridades as obras-primas de grandes pensadores.
A propósito da comparação esboçada por Duchatel, frisarei que ela encerra provavelmente uma grande verdade.
Em meu livro Os Fenômenos Premonitórios, me tinha concebido no mesmo sentido à conciliação das teses filosóficas do LIVRE-ARBITRIO e da FATALIDADE, consideradas em relação com a clarividência do futuro.
E a fórmula a que cheguei foi esta: - Nem livre-arbítrio nem determinismo absolutos durante a encarnação do Espírito, mas LIBERDADE CONDICIONADA.
Quanto ao problema suscitado pela previsão da morte em combate, na ignorância da guerra, observarei que estas lacunas tão misteriosas constituem a regra de todas as manifestações de clarividência do futuro.
O sensitivo prevê admiravelmente as vicissitudes que aguardam uma criatura, mas quase sempre ignora os acontecimentos de ordem geral, tais como guerras, revoluções, cataclismos.
A explicação deve filiar-se à circunstância de, na quase totalidade dos casos, socorrerem-se os videntes do EU integral subconsciente da pessoa que os consulta, de modo a não poderem logicamente perceber, como de fato não percebem, senão os fatos intimamente ligados à existência pessoal da criatura, com exclusão dos de ordem geral, mesmo quando formem uma parte integrante do seu futuro, como elementos causais.
Até aí o mistério se nos afigura suscetível de aclaramento.
Entretanto, o fato mesmo de admitir que os sensitivos extraem do subconsciente do consulente as suas percepções, levam, necessariamente, a perguntar corno os dados reveladores de futuros acontecimentos podem existir na subconsciência do indivíduo.
A essa objeção, já respondi na minha obra Os Fenômenos Premonitórios (págs. 119 e seguintes).
Basta. relembrar aqui que a única hipótese capaz de explicar o mistério seria a da REENCARNAÇAO.
Deveríamos dizer, então, que, se a existência terrena não representa mais que o elo de uma cadeia indefinida de vidas sucessivas e se o Espírito, no ato de reencarnar, fixa, a título de expiação, de prova e aperfeiçoamento espiritual os acontecimentos capitais da existência terrena (acontecimentos que se apagariam da memória fisiológica, ao franquear a vida, mas ficariam registrados no subconsciente para daí emergirem e se definirem graças a um processo análogo ao das sugestões pós-hipnóticas), fácil se torna compreender como pode o vidente, por vezes, descobri-los nos escaninhos da sua ou da subconsciência de outrem.
E, do mesmo passo, acontecimentos de outro modo havidos por fruto de cega fatalidade nos apareceriam como resultantes de atos livremente desejados.
Infelizmente, a explicação reencarnacionista não impede que o problema da fatalidade ressurja sob aspectos diferentes.
Se o EU espiritual de Raynal tinha fixado por si mesmo a morte violenta do soldado em ação, é força concluir que a guerra mundial também estava inexoravelmente resolvida de antemão.
E assim, eis-nos resvalando no problema formidável da existência de uma fatalidade transcendente, na orientação das coletividades.
Neste particular, advirto que, à vista dos fenômenos incontestes de clarividência do futuro, é difícil recusar ulteriormente a existência de uma fatalidade regendo 0 Mundo, ao menos nas suas grandes linhas diretivas.
Um tal postulado, sobre ser inevitável, apresentaria reconfortante aspecto filosófico, pois implicaria a existência de ENTIDADES ESPIRITUAIS, prepostas a governança da Humanidade, e, por conseqüência, à existência de DEUS e sobrevivência da alma: Si divinatio est, dü sunt. E esta. conclusão, ainda hoje, parece incontestável.
Mas, ainda assim, restaria resolver um problema originado do precedente, qual o interessante à questão moral: - a existência de Entidades que permitissem ou preparassem o desencadeamento de espantosas e sangrentas hecatombes, qual a que acabamos de assistir a poucos anos.
Esta grave proposição identifica-se com a da existência do MAL - uma tese posta de milênios por todas as filosofias, inutilmente, sem conseguirem elucidá-la. Limitar-me-ei a transcrever aqui uma frase do Doutor Geley, que diz : a existência do Mal é a medida da inferioridade dos mundos.